Só. Assim me sinto no nada em que me encontro.
Respiro. O oxigénio alimenta e liberta a minha raiva, a minha dor.
Só. Um vazio enorme que me engole, consome, devora.
Escrevo. Solto todas as amarras que me prendem e estrangulam.
Só. Não o estou mas sinto-me, perdida no eu infinito que despertou e, inclemente, reclamou como sua a realidade em que me insiro.
Choro. Lavo a mágoa que me marca e fecho a ferida aberta no recanto escondido do meu coração.
Só. Vivo.
Rosália
29/03/2006
Fernando D. C. Sousa (09/06/1944 - 09/08/1986)
Hoje é o teu dia, tal como o foi há já 30 anos atrás, quando soubeste que eu estava "encomendada" e a caminho. Este será sempre o teu dia e, quem sabe daqui a algum tempo, também os teus netos lerão estas linhas e conhecerão então o avô de quem a mãe tanto fala. Curiosa data esta que me fez despertar do torpor que a tua ausência no meu mundo tem sido ao longo de já tantos anos. Curiosa data esta que só hoje me apeteceu celebrar assim, talvez por sentir que a tua memória em mim ganhou nova força, nova vida mesmo que tu não regresses mais.
Olho estas fotografias e paro. Reflicto sobre o que tantas pessoas que nunca te conheceram me dizem: "És a cara chapada do teu pai!". Rio-me quando lembro também aquelas que me viam ao lado da Mãezinha na rua e diziam exactamente o mesmo, mas dirigindo-se a ela com um: "Tão parecidas! Parecem irmãs!" Cedo comecei a perceber que sou o resultado daquilo que se convencionou chamar uma "mistura bem feita", pois herdei as características de ambos de forma bem vincada. Até mesmo em questões de personalidade e aí, Paizinho, acho que estás a ganhar a corrida ;)...
Recordo-te muito. Por vezes, angustia-me pensar que já não me lembro da tua voz, dos teus gestos ou da forma como caminhavas. Tu vivias no mundo dos grandes e eu no das crianças. Ainda assim, sei que me amavas muito e me desejavas tudo de bom, o melhor que eu pudesse ter. A Mãezinha muitas vezes dizia que se eu, um dia, te pedisse a Lua, não hesitarias em ir buscá-la só para me veres sorrir.
Sei que partiste por um desígnio maior e, ainda que por vontade própria, tal caminho terá tido a sua razão e o seu propósito. Sofreste tu com a partida e nós com a tua ausência, mas sei que tal sentimento seria ainda pior se te tivéssemos visto, a ti que eras uma pessoa tão viva e activa, a definhar, lentamente minado por uma doença altamente incapacitante e ainda hoje (infelizmente) incurável.
Hoje quero dizer-te aquilo que não tornaste mais a ouvir da minha boca depois daquele último adeus tão cheio de mágoa e revolta por um gesto teu que, enquanto criança, não tive a mínima capacidade de entender, pois não fazia parte do meu mundo.
Gosto muito, muito de ti Paizinho e sinto ainda mais a tua falta. Para mim foste e serás sempre o melhor Pai do Mundo.
Como eu costumava escrever nos bilhetes que escondia no teu porta-moedas (para encontrares a caminho do trabalho, na manhã seguinte):
"Tem um dia bom. Beijinhos grandes da filha reguila que te adora, Rosália Maria".
Depois de duas noitadas seguidas para acabar um trabalho que foi muito mais do que isso (apesar de nos dar cabo da cabeça, foi um prazer fazer aquele pequeno livrinho), estou mesmo a precisar de seguir o exemplo aqui deste meu amiguinho... O PDI ainda é pequeno, mas já acusa as quase directas de forma bem veemente.
Deixo-vos com esta imagem ternurenta... E a certeza de que as semelhanças entre a fofura que está a descansar e a autora deste post são algumas, especialmente se atentarmos na barrigota rechonchuda!
Beijinhos e boa semana a todos!
PS: Curiosos sobre a sigla PDI? Pensem um bocadinho... Já está? Não atingiram? Ok, pronto, eu revelo: Peso Da Idade... Eheheh!
Os meus cantinhos