Paro.
Inspiro lentamente e olho à minha volta.
Ao meu redor nada mais do que o espaço de uma sala vazia. As paredes, lisas e brancas, cegam-me na sua nudez. Uma única janela, pequena, quase minúscula, esta lá mais ao fundo, na minha direcção. O chão, polido por anos consecutivos de passos e desgastado pelo tempo, deveras escorregadio, inibe-me os movimentos, os passos que sei serem necessários para poder atingir aquela luz, tão perto e ao mesmo tempo tão longínqua, de que preciso tanto ou mais do que uma inspiração que me dá o ar e me permite respirar, logo, viver.
Rodo lentamente sobre o meu próprio eixo neste nada que é tudo o resto. O mundo está ali, além daquela janela, além deste sítio que tenho como meu e no qual me sinto em segurança.
Penso.
Em tudo e em todos. Em tudo o que me é querido. Em todos aqueles a quem mais amo.
Questiono-me.
Será viável abandonar tudo isto em prol de um objectivo maior, egoísta talvez, que é o alcançar daquela janela, sendo que para tal terei de sair daqui, onde o chão é firme, e pensar por e para mim?
Hesito.
E se escorregar? Se cair? Se tiver de magoar alguém para atingir a luz e, em última análise, a liberdade?
Valerá a pena arriscar e SER EU ou é mais seguro permanecer no SER ASSIM?
Um poeta disse, um dia, "tudo vale a pena quando a alma não é pequena". Palavras sábias apenas suplantadas pelo incentivo cego e premente de quem verdadeiramente me ama e que, sei-i, ainda que eu caia, lá estará para me amparar.
Um passo.
Avanço. Agora não há volta a dar. À parte tudo quanto possa acontecer, sei que tenho de alcançar aquela luz que me guia e motiva.
Escorrego.
A estranheza perante a falta de medo de quebrar o que era tido como inquebrável - às vezes uma simples postura de submissão e aceitação tidas como perenes e intocáveis - é muita e, até mesmo, mal recebida.
Estremeço.
Ao embater contra este rumo, procurando forçar a existência do que já passou e ficou para trás. Os piores obstáculos que temos de enfrentar num caminho como este são os inesperados e há-os por demais.
Caio.
Dizem que o que não nos mata torna-nos mais fortes, porque aprendemos. Na minha queda, a dor da pancada dupla dos embates sucessivos ao atingir o chão faz-me soltar lágrimas e sentir perdida.
Preservero.
Não vou desistir. Vou escorregar e cair mais vezes; se calhar, até mesmo partir algo mais que não apenas o meu coração. Contudo, nada é impossível nem inalcançável.
Sei.
Um dia vou atingir a luz branca. Já dei muitos passos desde então e a distância encurtou-se bastante. A cada um a liberdade é maior. Quando abrir aquela janela, voarei e, afirmo, serei uma pessoa melhor pois, doa a quem doer, serei EU!
Rosália
Os meus cantinhos